sexta-feira, 5 de novembro de 2010

AGORA É QUE COMEÇA A LONGA MARCHA



foto amancio chiodi


Por Mylton Severiano



A vitória de Dilma Roussef me lembra a sapiência (chinesa) do Mao Tsetung, ao vencer em 1949 o exército reacionário de Chiang Kaichek. Não estou querendo comparar a vitória da Revolução Chinesa com a vitória de Dilma, embora enxerguemos semelhanças e guardemos as proporções: nos dois casos surgiu cada pedra no meio do caminho que, no nosso caso, por vezes eu vi a viola em cacos, assim como aconteceu em diversos momentos com Mao e seus homens na Longa Marcha; e igualmente as forças do progresso e do avanço da humanidade, aqui como lá, enfrentaram inimigos sórdidos, em certos momentos, cruéis mesmo. E, por aqui, sandices de pôr em risco as instituições de alto a baixo e confusão mil vezes maior que aquela provocada pela renúncia de Janio Quadros em agosto de 1961, que precipitou o golpe militar de 1964.


Bem observou Janio de Freitas (FSP 2 de novembro de 2010) que coube a José Serra “o ato mais irresponsável e injustificável de toda a sucessão”: aceitar como vice um patife como Índio da Costa, que ele sequer conhecia, desqualificado como político e como gente – nas palavras de Janio de Freitas, “atrabiliário, violento, político recente, sem credenciais de talento especial ou maior competência”. Enfim, “um cocô-boy”, no dizer de nosso amigo Palmério Dória, que observou mais: Índio foi criado junto com Rodrigo Maia, presidente dos demos, filho de Cesar Maia, o trânsfuga, que caiu fora da jogada e sequer recebeu Serra quando foi ao Rio, deixou o Índio segurar essa bucha.


Janio, o jornalista, põe em foco algo a que quase ninguém prestou atenção, a escolha do vice, “ato de extrema responsabilidade”, pois em caso de impedimento de Serra por algum “incidente” (68 anos), “Índio da Costa era um risco de calamidade”. De mais essa escapamos. E até do papa nazi!


Mas por que comecei o texto lembrando a vitória de Mao e o que ele disse em 1949? Aconteceu que o Exército Vermelho vencedor merecidamente se pôs a comemorar. E ao cabo de alguns dias Mao chamou todos às falas, já festejamos, mas está de bom tamanho o festejo:“O mais difícil começa agora.”


E Dilma foi descansar até domingo. Depois de passar três meses matando um leão por dia, ela merece. Só que agora começa o mais difícil. Segurar as conquistas e avançar. Se cada um de nós que lhe demos o voto puser “um tijolinho que falta nessa construção”, a gente avança.

É a busca de novos valores, estúpido!

Marco Antonio Villa, professor universitário de Ciências Sociais, escreveu na FSP de quarta 3/11/2010 artigo carregado de despeito pela vitória de Dilma Rousseff. Encaixa-se a si mesmo nos 44% que “disseram não” à primeira mulher a governar o país. Dá a receita para a oposição chegar lá, num pensamento desejoso – como o do galo, que pensa que o dia nasce porque ele cantou. O professor quiquiriqui sugere que a oposição organize um gabinete-fantasma – com quem? Com Serra e Índio da Costa? E que crie um projeto alternativo para o Brasil – mas a oposição ficou “lá” oito anos vendendo tudo quanto podiam de nossos bens para pagar a dívida que deixaram maior ainda!


Para fechar o artigo com chave de ouro, Villa lança mão de Monteiro Lobato, que acusou nossos estadistas de “raramente pensar com os miolos” – mas Lobato falava da República Velha, não é mesmo, professor? E Villa aproveita para pegar carona numa celeuma atual, e acusar o “lulismo” de perseguir Lobato, como o fez a “ditadura Vargas”. Que sofisma chinfrim. O que li na própria FSP:


1. O Conselho Nacional de Educação, atendendo a parecer de uma conselheira, resolveu recomendar que escolas públicas não recebam o livro infanto-juvenil Caçadas de Pedrinho


2. Os conselheiros ficaram incomodados com uma frase, segundo a notícia, em que Tia Nastácia, com medo da onça, sobe numa árvore como “uma macaca de carvão”. Consideram a frase “preconceito”. Bem, se Tia Nastácia fosse branca e trepasse na árvore que nem macaca de giz, tudo bem, não?


3. Outra frase citada é “Não é à toa que os macacos se parecem tanto com os homens. Só dizem bobagens”. Revoltado, escrevi uma mensagem tuitada por Palmério Dória: Baixou Goebbels no Conselho Nacional de Educação: querem proibir Caçadas de Pedrinho de Lobato por uma frase considerada preconceituosa.


Mas, francamente, diante do que estão dizendo conselheiros sobre o livro e intelectuais como Marco Antonio Villa, sobre o veto ao livro e sobre a vitória de Dilma, a frase de Lobato sobre a semelhança entre macacos e certos humanos é bastante verdadeira.


Não é só a economia, não!


O mote da campanha de Bill Clinton em 1992, “É a economia, estúpido”, quando respondeu a Bush pai sobre qual era o foco de seu plano de governo e com isso se saiu vitorioso, virou lugar comum citado até hoje por metidos a sabichões.


A última campanha eleitoral suscita tema novo e igualmente importante, talvez mais ainda que apenas economia. O adversário de Dilma rebaixou a campanha o tempo todo, ora com zombarias (o boneco feminino do brinquedinho Babushka comum entre os povos eslavos, aludindo à origem búlgara de Dilma, é mostrado oco quando se refere à então candidata), ora com preconceito contra a mulher (Ela não vai dar conta), ou a baixaria ominosa, execrável, da ex-mulher de Serra saindo por aí a dizer que Dilma era a favor de matar criancinhas – a hipócrita, pois soube-se a seguir que ela cedeu à pressão do então marido e praticou um aborto, ela própria, na mocidade.


O nível da campanha tucana era o mesmo do que temos visto na temporada – alunos de Medicina, portanto universitários (?), a promover o Rodeio das Gordas, “cavalgando” suas colegas e medindo o tempo para ver quem “ganhava”, ou seja, quem ficava mais tempo “no lombo”, e um dos acanalhados, Roberto Negrini, a dizer que era apenas “brincadeira”, “diversão”; a estudante de Direito (?) Mayara Petruso, identificada como a praticante do crime de incitação ao crime, que disparou na internet mensagem dizendo que “nordestino não é gente” e pedindo que “façam um favor a SP, matem um nordestino afogado”, enraivecida com a derrota de Serra. São apenas dois exemplos, do acanalhamento vigente em certos estratos médios e altos, enquanto entre os pobres reina a pichação de escolas, a depredação, os suburbanos homofóbicos que chegam a matar gays.


É preocupante. Não nos esqueçamos de que mais de 40 milhões votaram contra Dilma. É uma quantidade enorme de brasileiros, que, votando em Serra, no mínimo fazem vista grossa às suas grosserias e, mesmo, atitudes trapaceiras como fingir-se ferido por uma bolinha de papel ou rolo de fita adesiva.


Que tal se, quando alguém perguntar na próxima campanha eleitoral qual é a proposta, a gente responder:


“É a busca de novos valores, estúpido!

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