segunda-feira, 13 de setembro de 2010

DEU NO BLOG DO BOURDOKAN - ARTIGO DO NOBEL DA PAZ

domingo, 12 de setembro de 2010


A contaminação informativa*

Por Adolfo Pérez Esquivel**



A vida dos povos está submetida aos impactos ambientais, à contaminação auditiva e visual da palavra e das idéias, como se houvesse um monocultivo das mentes. Os avanços tecnológicos são utilizados, muitas vezes, para o controle dos meios de comunicação e, com isso, servem também para condicionar e manipular os povos. Nenhum meio informativo é asséptico, mas eles deveriam basear-se na ética e no serviço aos povos em vez de servirem-se dos mesmos.Uma das grandes conquistas da lutas sociais foi a liberdade de imprensa, o direito de informar e ser informado, mas os grandes monopólios econômicos, ideológicos e políticos que controlam os meios de informação acabaram por matar a liberdade de imprensa, querendo, inclusive, confundi-la e reduzi-la a "liberdade de empresa". 


A contaminação da palavra e da propaganda midiática chegou a tal extremo que não permite ver com claridade onde está a veracidade informativo. A ética e a busca pela verdade estão ausentes, prevalece a distorção da realidade. A CNN é um exemplo desta contaminação que sofrem os povos. Sua ação com relação ao Iraque foi - e é - para justificar a guerra ao difundir que aquele país possuia armas de destruição massiva.Algo semelhante estão armando agora contra o Irã e outros países.
Por outro lado ocultam os massacres e assassinatos de crianças e da população civil no Iraque e no Afeganistão, onde os que dizem defender a "democracia" se dedicam ao saque do patrimônio do povo iraquiano e implantam centros de tortura levando a estes lugares apenas a destruição e a morte.A mídia os acusa de praticar o "terrorismo islâmico", quando os verdadeiros terroristas são os torturadores e assassinos que invadiram esses países, violando os direitos humanos, o direitos dos povos e todas as convenções internacionais.Os grandes monopólios informativos da Europa, EUA e América Latina estão em forte campanha internacional para atacar e desprestigiar governos como o de Hugo Chávez, na Venezuela, acusando-o de tirano e de todos os males, ignorando, em seus silêncios mal intencionados, que Chávez é um dos poucos presidentes que se apresenta ao povo em eleições seguidas e se reelege por conta de suas políticas sociais e do trabalho em prol dos setores mais esquecidos da população.
Outro desprestigiado pela mídia é o presidente Evo Morales, da Bolívia, que tem suportado a campanha dos meios contra seu governo que tem buscado a integração e a vida dos povos num país pluricultural e nacional, tendo tocado nos interesses econômicos e políticos que sempre dominaram na Bolívia.As campanhas midiáticas dos grandes monopólios informativos estão dirigidas para a contaminação mental que debilite os governos progressistas. Através do tempo vemos que isso sempre ocorreu com Fidel Castro e o governo cubano, 50 anos de resistência e assombro do mundo frente aos avanços e capacidades de seu povo, seus programas de saúde, educação e luta contra o analfabetismo e a pobreza.O evidente é que Cuba tem um povo solidário com os povos mais necessitados e os fatos falam por si mesmo. Desde muito tempo, antes mesmo do terremoto no Haiti, Cuba já havia enviado médicos, educadores e engenheiros para apoiar e trabalhar solidariamente junto com o povo haitiano, vítima da pobreza, da marginalidade, violência social, estrutural e dos desastres naturais.
Os Estados Unidos, como resposta às necessidades do povo haitiano, enviou 20 mil soldados para controlar e submeter o povo. Mas disso não se fala. Os meios e as campanhas jornalísticas estão a serviço dos interesses econômicos e políticos dos poderosos para submeter os povos.Muitas ações solidárias e fatos positivos são ocultados pelos meios. A presidente Cristina Fernández Kirchner em sua viagem à Europa assinalou a crise vivia por aqueles países e sugeriu que eles não aceitassem a receita do FMI e do Banco Mundial, advertindo para as graves consequências sobre a vida do povo argentino e a crise financeira.
 
Pluralismo
A soberba dos grandes meios de comunicação europeus fez com que se referissem a ela de forma depreciativa, dizendo: "Essa senhora que nos quer ensinar o que devemos fazer". Seria bom e saudável que prestassem atenção aos conselhos da presidenta que solidariamente lhes estendeu a mão.Tornei público e sustento que a Lei de Mídia Audiovisual sancionada pelo Parlamento argentino é necessária, já que permite romper com o controle dos monopólios informativos, gerando o pluralismo jornalístico e recuperando a liberdade de imprensa.
A reação das corporações, como o grupo Clarín, desataram uma campanha virulenta contra o governo, acompanhada de uma oposição sem idéias, que busca unicamente golpear o governo e que tem todos os meios a sua disposição como uma pitonisa que anuncia toda uma série de catástrofes, sem diferenciar os avanços do governo, assinalando apenas seus erros. Isso é bem preocupante para a democracia.
Com o tema da Papel Prensa, empresa monopólica, é necessário investigar o período da ditadura militar que a favoreceu. A família Graiver, antiga dona, foi submetida a sequestros, torturas, cárcere, morte e foram desapropriados seus bens.O governo argentino iniciou uma investigação para determinar responsabilidades.
Assim como com relação à Papel Prensa, a ditadura se utilizou de manobras similares para se apropriar de empresas e recursos dos irmãos Iaccarino, vítimas da violência e da impunidades estes anos todos.Ao mesmo tempo, o governo, e tenho sinalizado isso o tempo todo, não sabe e não quer dialogar. É um governo de confrontação e de agudização de conflitos, se move com soberba e pouco sentido político para resolver os problemas do país.
A isso se somam as políticas dos senhores feudais, que fazem o que querem e o que não devem, e levam as províncias à desintegração social, cultural, política e econômica. Uma coisa é o federalismo que compartilha a integração e um projeto de país, e outra o feudalismo que leva à desintegração nacional.
 
Novo contrato social
A política neoliberal que impulsiona o governo não se modificou desde o "menemismo" que tanto mal fez ao país. Pelo contrário, se aprofundou, porque uma coisa são os discursos progressistas e outra é a realidade.O problema político e econômico do governo e da Sociedade Rural Argentina não são muito diferentes, simplesmente a disputa está em que fica com a parte maior da torta.Basta ter presente que o governo não faz nada para frear os danos ambientais e os agrotóxicos, nem a exploração da mega mineração com seus desastres e danos para a saúde das populações e suas economias regionais e familiares.Por outra parte, devemos ter em conta que o governo, em suas contradições, avançou em diversos campos sociais. Seria importante para o país que as forças progressistas, opositoras ao governo, apresentassem alternativas ao modelo imperante, em lugar de ficarem em críticas que não levam a lugar algum.Os desafios são enormes e é preciso repensar o país, gerar um novo contrato social que permita avançar na construção democrática e para a vigência dos direitos humanos em sua integridade.A liberdade de imprensa permitirá maior consciência crítica e o fortalecimento de valores éticos, sociais, culturais e políticos. Superará a contaminação informativa e assim poderemos pensar no país que queremos.
 
(*) Publicado originalmente pela agência Alai e republicado pelo Instituto de Estudos Latino-Americanos da Universidade Federal de Santa Catarina. Tradução: Elaine Tavares
**Prêmio Nobel da Paz

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